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A mordaça do Patrão

Silvio Santos impõe um doloroso cala a boca à jornalista que num passado recente incentivou o espancamento de um bandido em rede nacional. Se é legítimo ao veículo adotar uma linha editorial, o dono da segunda maior emissora do país mostra que a regra na sua empresa é jamais incomodar os poderosos.

Silvio Santos é o maior comunicador da história da
televisão brasileira. Até hoje, com quase 90 anos, apesar de manter um programa
preguiçoso e mal produzido, é mestra na arte de comunicar. Seu carisma e
domínio de palco são inspiradores para as novas gerações.

O Troféu Imprensa, aquele pseudoprêmio dado a artistas da
música e da TV, mantido pelo apresentador há várias décadas, não empolga mais
ninguém. É dado por um grupo de jornalistas e críticos televisivos em várias
categorias, muitas delas criadas para premiar o elenco da emissora que organiza
o programa, ou seja, o SBT.

Dada a irrelevância,  o que se assiste é uma sucessão aberrações na
lista dos melhores, com Anitta figurando como melhor cantora, Wesley Safadão
como melhor cantor, ou Sabrina Sato como apresentadora.

De vez em quando, o programa oferece bons momentos, em
que o próprio Silvio protagoniza reencontros com outros grandes nomes. O depoimento
do jornalista Carlos Nascimento revelando a postura humana do patrão quando da
renovação de contrato no momento do diagnóstico de um câncer é belo de se
ouvir. Silvio reencontrando um emocionado Jô Soares também foi um momento para
os anais da TV. Nada, no entanto, justifica a deselegância, para dizer o
mínimo, com que ele tratou a jornalista Rachel Sheherazade.

Antes da cena constrangedora tenho que dizer que
sempre me incomodou a postura desbocada de Silvio Santos com alguns de seus
convidados. Com exceção dos artistas da mesma geração, Silvio conduz as
conversas com frases do tipo “quem é você?”, “o que você faz da vida?” ou “nunca
ouvi falar de você”. Quando não, ignora o trabalho de cantoras ou atrizes para
simplesmente enaltecer os corpos das entrevistadas, com jargões que cheiram a
naftalina de tão retrógrados. No alto de seus quase 90 anos e sendo dono da
emissora, se auto concedeu um salvo-conduto, numa expressão da jornalista Cynara
Menezes, que lhe dá permissão para essas estripulias.  Já cansei de sentir vergonha-alheia assistindo
ao programa SS.

Porém, poucas vezes vi algo tão constrangedor quanto
ao “sabão” que ele passou a Sheherazade. A jornalista, que criou diversas polêmicas durante
o período em que tinha autorização para tecer comentários durante o jornal, não
conseguiu disfarçar (nem deveria) o incômodo ao ouvir de Silvio Santos que se
ela quisesse comentar sobre políticas deveria comprar uma emissora de TV. Para
não cometer exageros, transcrevo trechos ditos pelo próprio apresentador em
rede nacional:

 

“Se quiser falar sobre política, compre uma estação
de TV e faça por sua própria conta”

“Você foi contratada para ler notícias, não foi
contratada para dar opinião”

“Não, eu te chamei para você continuar com sua
beleza, com sua voz, para ler as notícias, e não dar sua opinião”

 

A mensagem é clara: para Silvio Santos, a regra é
nunca incomodar os poderosos de plantão. Uma pena, pois alguém com tamanha
penetração popular, teria muito a contribuir com o país do que apenas vender o “Baú
da Felicidade” ou rodar o “Peão da Casa Própria”.

Em tempo: defender o direito à liberdade de opinião,
ainda mais no jornalismo, não necessariamente significa concordância com o que
é escrito ou falado. Sheherazade nunca me encantou. Suas falas não vão além da
superfície e do discurso demagogo. Mas o que patrão fez foi ainda pior.  

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