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A recomendação do professor Celso

"Havendo sinal de internet e bateria no celular, posso acessar o conteúdo a qualquer momento. Mas a sensação é a mesma de comer um quilo de biscoito de polvilho"

Acho que comecei a ler jornais com oito anos. Naquela época, consumia as crônicas policiais e as resenhas de filmes do Notícias Populares, diário sensacionalista que circulou de 1962 a 2001.

Essa prática ficou mais séria a partir de 2009, quando frequentei um curso pré-vestibular noturno. Talvez ciente de que a maioria dos alunos daquele período trabalhava e tinha pouco tempo para estudar, o professor Celso, de biologia, recomendava: leiam jornal aos domingos, dia em que há mais recheio e o resumo dos principais assuntos da semana.

Tornei-me assinante no ano seguinte e o costume dominical passou a ser realizado no cotidiano. Entre o fim do expediente na firma e o início da primeira aula no curso de Letras, fazia de tudo para conferir o máximo possível de informações, principalmente as que estavam no caderno de cultura.

Com o declínio do uso de papel, hoje, mantenho duas assinaturas digitais. Havendo sinal de internet e bateria no celular, posso acessar o conteúdo a qualquer momento. Mas a sensação é a mesma de comer um quilo de biscoito de polvilho. Na época em que a correria me permitia só folhear páginas, sentia-me mais satisfeito.

Ainda é possível ter acesso aos fac-símiles das edições impressas. Nos últimos dias, tenho lido as versões digitalizadas na tela do smartphone. Porém, é necessário paciência no uso sincronizado do indicador e do polegar para aumentar ou diminuir o zoom, além de haver o risco de fechar acidentalmente a janela. A pior parte é não fazer as palavras-cruzadas.

Entretanto, vislumbrar as manchetes e os textos espalhados sobre a mesma superfície melhora bastante a experiência de leitura. Ao ler o último artigo, não sinto mais necessidade de atualizar a cada hora os sites da Folha ou do Estadão em busca de um fato novo. Cabeça, coração e estômago agradecem.

Fico pensando se o professor Celso ainda é adepto dos jornais impressos e se continua recomendando que seus alunos os leiam nesse formato. Ou será que ele também passou a lê-los no black mirror, praguejando a cada vez que a página é desconfigurada ou fechada?

Luis Antônio
Luis Antônio
Jornalista. Formado em Ciências Sociais e Letras pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Mestre em Estudos Literários. Apresentador e editor do Jornal da Morada, da Rádio Morada FM 98,1
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