O período que abrange o final da década de 1990 e início dos anos 2000 foi de muita satisfação para os amantes do voleibol de Araraquara, que puderam acompanhar de perto um timaço do Lupo Náutico, que fazia do Gigantão um dos ginásios mais temidos pelas grandes equipes do Brasil. Naquela época, o torcedor se dirigia ao ginásio certo de que a determinação e a técnica daquele grupo bateriam de frente com os maiores investimentos financeiros dos times favoritos que desembarcavam em Araraquara.
O Portal Morada conta agora a história de um atleta que integrou a equipe e acompanhou momentos de glória e muita comemoração, como o vice-campeonato no Sul-Americano de 1997 na Argentina, até a tristeza do fim do time em 2010. Trata-se do central Balu, que hoje está aposentado do cenário profissional, porém ainda respirando o voleibol, já que possui um projeto social que utiliza a modalidade como instrumento de educação e socialização em Araraquara. Confira!
O início em Minas Gerais
Nascido em Belo Horizonte-MG no dia 1º de novembro de 1972, Geraldo Alexandro de Oliveira, o Balu, é filho de Lauzinho Tomaz de Oliveira, falecido em 1976, e Maria Basília Ribeiro de Oliveira, falecida em 2018. O casal também lhe deu um irmão, Márcio Eduardo Ribeiro de Oliveira, falecido em 2017.
Nascido e criado no bairro Maria Goretti, na periferia da capital mineira, o menino conheceu o vôlei na infância, mas não se adaptou de primeira. "No bairro tinha uma turma grande que todo sábado e domingo à tarde se reunia pra jogar vôlei no terrão, mas não me deixava jogar porque eu era muito ruim", brinca.
Seu caminho no esporte
Seu instinto esportivo começou a ser ativado na escola. "Eu jogava handebol e vôlei pelo Colégio Municipal Carlos Lacerda. Tínhamos jogos inter-municipais fantásticos e que envolviam todas as escolas municipais de BH", relembra.
Por conta de sua atuação nesses torneios, o garoto foi incentivado por um professor de educação física a fazer um teste de voleibol no Minas Tênis Clube, um time que estava em evidência nacional por ter acabado de ser tricampeão brasileiro. Passou no teste com 13 anos e lá passou por todas as categorias de base, do mirim ao profissional, inclusive com participações na Seleção Mineira Juvenil. "Em meu primeiro jogo como profissional, entrei em quadra para substituir nada mais que o Paulão, que tinha acabado de ser campeão olímpico em Barcelona. Senti desde dor de barriga a tremor nas pernas, mas foi a melhor sensação que um moleque poderia sentir. Um sonho realizado", destaca.
Desde então, Balu construiu uma carreira repleta de superações e conquistas. Em sua trajetória profissional, atuou ainda por Fiat-Minas-MG, Lupo Náutico Araraquara, Banespa-SP, Castelo da Maia-Portugal, AJFB (Associação Jovens Fonte do Bastardo-Açores)-Portugal, e Vôlei Futuro Araçatuba-SP. Em todas essas equipes, o atleta teve muito sucesso e boas lembranças de conquistas. No Minas foi tricampeão mineiro, no Lupo Náutico foi semifinalista da Superliga e vice-campeão sul-americano de clubes, no Banespa foi bicampeão paulista, campeão da Supercopa de Vôlei e vice campeão da Superliga. No Castelo da Maia sagrou-se campeão português e campeão da Taça de Portugal, além de semifinalista do campeonato europeu (Top Teams Cup), onde conquistou o prêmio individual de melhor bloqueio do campeonato. "Esse título veio brindar toda a minha carreira", conta ele, que também sagrou-se campeão da Liga B com o Vôlei Futuro e depois com o Lupo Náutico.
Momento marcante da carreira
O momento mais marcante na carreira de Balu aconteceu na Europa. "No final do Europeu, a organização do torneio foi chamando jogadores variados a receber prêmios individuais, como melhor saque, melhor recepção, melhor ataque, etc. Quando falou meu nome, levei alguns segundos pra entender, pois estava na Áustria, e foram meus companheiros em festa que me avisaram. Aquela equipe era muito forte, base da Seleção, mais eu e outros dois brasileiros", relembra.
Uma 'família' no Lupo Náutico
Balu era uma das peças-chave de um time que deixou saudades em Araraquara. O Lupo Náutico atraía sempre um grande público aos jogos no Gigantão e colocou o vôlei de Araraquara em um patamar inédito. O período foi consagrado com o vice-campeonato do Sul-Americano em 1997, que fez a delegação ser recebida com festa em seu retorno à cidade.
O ex-jogador se orgulha ao falar daquele elenco. "Aquele time do Lupo foi mesmo uma vitrine para muita gente. Temos que respeitar todos aqueles que vieram antes, como técnicos e jogadores, e também aqueles que vieram depois, pois tenho a certeza da importância de cada profissional. Mas aquela equipe!? Ela parava a cidade nas quartas, sábados e domingos, formava fila nas bilheterias, era notícia em todos os veículos de comunicação. Você mal podia andar na cidade que era parado por alguém para te felicitar e te agradecer. Era demais! O Zé Paulo [Peron, técnico] e sua equipe técnica tiveram muita competência e felicidade em montar uma equipe com jovens que buscavam afirmação no cenário nacional dentro da vitrine que é o Campeonato Paulista de Vôlei", salienta Balu.
Ele revela uma sintonia entre todos os integrantes do grupo, que se empenhavam em fazer do Lupo Náutico um time duro de ser batido no Gigantão. "A gente era muito afim, focado, 'sangue-nos-olhos' mesmo, e se respeitava até mesmo na hora da bronca um no outro. Nosso lema era dar os 100% em qualquer jogo. Não admitíamos ninguém vir aqui em Araraquara fazer festa. Jogar com o Lupo era o terror para os grandes e as equipes iguais a gente atropelava, não tinha conversa. Tínhamos amigos em todas as equipes, mas quando começava o jogo éramos rivais. Até nas festas nos contíamos, pensando no jogo da semana seguinte. Éramos uma grande família. Tenho contato com todos eles", revela.
Fim do time e aposentadoria das quadras
Após tantas alegrias para o esporte de Araraquara, o Lupo Náutico foi aos poucos perdendo sua força. "Quando começamos a receber propostas de grandes equipes, comecei a sentir aquela equipe se desfazendo. Claro que isso uma hora aconteceria, mas acho que naquela época faltou alguém falar em um projeto para dar uma continuidade com apoio apropriado. Deveriam ter se pensado em um futuro próximo", opina.
Sua despedida das quadras coincidiu com a despedida do próprio Lupo Náutico, na temporada 2010/2011. "Esse foi o último ano e a patrocinadora era a Let´s. Não foi nada fácil. A cabeça já não era a mesma, as condições também, apesar de todos os esforços do patrocinador e comissão técnica. Lembro, por exemplo, que na Superliga, a princípio tínhamos até então um convênio da CBV com uma empresa aérea e rede hoteleira, mas na última hora cancelaram esse convênio e deixaram as equipes com menor poder na mão. Fizemos viagens cansativas, mas repito, com o maior esforço do patrocinador em dar o melhor. Não foi fácil e aí foi se acabando a trajetória do volei masculino em alto nível aqui em Araraquara. Triste", lamenta.
Reencontros pontuais
O fim da equipe não acabou com a amizade entre os jogadores que marcaram seus nomes na história do voleibol araraquarense. Posteriormente, eles se reuniam todo ano, mesmo com alguns deles em outros times e outros aposentados, para jogarem por Araraquara nos Jogos Regionais. O resultado era um verdadeiro show nas quadras e muito aplauso nas arquibancadas. Mesmo os torcedores adversários se rendiam à qualidade e ao entrosamento da equipe araraquarense, que tinha lugar quase garantido no pódio.
Mas o falecimento do ex-jogador André Luís de França, o Andrezão, em 2013, resultou em uma homenagem que marcou uma das últimas reuniões do grupo. "Sempre era motivo de muita festa. Com todo respeito às outras cidades, a gente tinha a obrigação de ganhar. A Secretaria de Esportes sempre deu como certa a medalha de ouro e nunca foi diferente. Eu posso te dizer que nunca perdi uma edição de Regionais. Mas sem dúvidas, o último que joguei foi o mais emocionante, que foi a homenagem ao Andrezão, onde conseguimos reunir boa parte daquele timaço do Lupo. Foi muito emocionante", relata Balu.
Vida familiar e um projeto social de respeito
Hoje, Balu tem mais tempo para se dedicar à família. É casado desde 1999 com Rosa Gonçalves de Oliveira, com quem está junto desde 1996. "Tenho dois filhos: o Murilo, hoje com 17 anos e que ingressou na Faculdade Federal, e o Davi, que faz 9 anos daqui a alguns dias e estuda no COC. Uma família linda!", se orgulha o campeão.
Outro motivo de orgulho do ex-atleta é seu projeto social chamado 'Saque essa Jogada', que começou em 2016 com muito suor e com a vontade de compartilhar tudo aquilo que ele aprendeu ao longo de sua trajetória nas quadras. "Com a ajuda de alguns amigos, técnicos de outras equipes do Brasil, consegui alguns materiais como bolas e rede. Consegui uniformes com o apoio total do Léo da World Game, meu irmãozão, que continua me ajudando sempre. O projeto foi ficando mais sério e tive a ajuda de advogados amigos, que montaram um estatuto e me ajudaram a criar uma associação. Sou muito grato, pois tive ajuda de empresários dos mais variados, desde loja de roupa a materiais de construção, pais que me ajudaram com seus nomes para montar essa associação, pais que ajudam em todos os sentidos", agradece.
Assim, o projeto foi oficializado no ano passado. "Em um chamamento público, foi criado nessa gestão do prefeito Edinho Silva, que visitou a molecada. Foram respeitadas todas as etapas do chamamento e a associação foi contemplada para ampliar o projeto nos bairros do Vale do Sol, Maria Luiza, Selmi Dei e no Colégio COC, que abriu as portas da escola para que se montasse um polo dentro de suas dependências, inclusive com crianças que não estudavam na escola. E a direção da escola foi além: deu três bolsas de estudo de 100% para alunos de baixa renda do projeto que se destacassem. Com todas estas conquistas, estava prontinha a proposta de renovação do projeto, porém tivemos que parar por conta da pandêmia", conta.
E é justamente a pandemia do novo coronavírus que deixa o futuro do projeto indefinido. "Sinceramente, estou bem preocupado. Até um pouco mais de um mês atrás, estava prevendo um futuro legal pra esse projeto. Na nova proposta de trabalho tinha, por exemplo, uma ajuda de custo para um aluno do projeto que vem acompanhando a gente desde o começo e hoje faz faculdade de educação física. Ele iria ajudar como auxiliar, isso é progresso. Mas agora não temos certeza de nada. Depois que a pandemia explodiu no mundo, temo que o esporte mundial sofra. Fico pensando, por exemplo, como fica o esporte que amo e dediquei minha vida, sem aproximação, sem contato, isso que estou falando do voleibol. Rezo para que se descubra logo uma imunização urgente, até mesmo porque o esporte sempre foi associado a uma vida saudável. Não viveremos sem esporte. Esporte move o mundo, esporte é vida. E para que haja esporte, precisamos investir e incentivar a base. Esse árduo trabalho como o que faço, de direcionar e incentivar o jovem e o adolecente, não pode parar", finaliza Balu.
Confira abaixo fotos da carreira de Balu!