InícioCidadesCidadeCoronavírus: Jornalista de Araraquara relata rotina na Itália

Coronavírus: Jornalista de Araraquara relata rotina na Itália

País europeu ultrapassou neste sábado a marca de 10 mil mortos pela pandemia

"Estamos assustados com a evolução da pandemia". O relato é do empresário e jornalista Reginaldo Maia, de 45 anos, que reside na Itália com sua esposa, a empresária Alessandra Cambiaghi, 49, e com os filhos Laura (17), Gabriel (9) e Sophia (7). O sentimento de insegurança é justificado pelos números, já que neste sábado (28), o país europeu superou 10 mil mortes provocadas pelo novo coronavírus, com 889 vítimas fatais nas últimas 24 horas.

A região mais afetada do país, com quase 40 mil casos e quase 6 mil mortes, é a Lombardia, justamente onde fica localizada a cidade que, há dois anos, recebeu de braços abertos a família de Araraquara. "Moramos em Busto Arsizio, a maior cidade da província de Varese, na Lombardia. Estamos a cerca de 30 quilômetros do centro de Milão, ou seja, no olho do foco da pandemia", descreve Reginaldo, em entrevista ao Portal Morada.

O empresário destaca a maior dificuldade de quem passa pelo drama de uma pandemia que leva vidas e traz indefinições. "Psicologicamente é um desafio terrível. Além da crise financeira que vem pela frente e da saúde pública que chegou ao seu limite, somos obrigados a administrar o medo. O isolamento social e restritivo te faz impotente. E você não sabe quando vai terminar isso, se é daqui a 30, 90 ou 120 dias. 

Medidas rígidas

Reginaldo relata que, no início, o povo da Itália não imaginava que a pandemia chegaria a essa magnitude. "O italiano não levou a sério e muitos ainda não compreenderam a gravidade da situação. Por isso que o governo italiano vem decretando medidas cada vez mais rígidas, com multas pesadas e sentenças de prisão para quem não respeitar a ordem de ficar em casa. Por ter uma população idosa e ativa, o índice de letalidade ficou muito acima da média mundial", explica.

O jornalista aponta que um fator determinante para a disseminação incontrolável da doença foi a prioridade voltada para o setor econômico em um momento crucial para a contenção do vírus. "É claro que o governo errou, tanto é que o prefeito de Milão acaba de reconhecer que errou ao apoiar a campanha 'Milão não para'. A preocupação deles era apenas com a economia e subestimaram a capacidade letal do vírus. Hoje eles correm atrás do prejuízo, com medidas cada vez mais duras para tentar conter o avanço da doença", acrescenta. 

Cenas marcantes

Reginaldo Maia falou sobre uma imagem dramática que ficará para sempre em sua memória. "A pior cena, vista pela televisão, foi ver caminhões do exército levando centenas de caixões de Bergamo para serem cremados em outras cidades. Tenho amigos lá e acompanho a angústia deles", lamenta.

Por outro lado, ele também destaca o sentimento de união que foi ativado pela pandemia no país. "O povo italiano é muito patriota. Aqui existe uma frase muito difundida que é 'tutto andrà bene', que quer dizer 'tudo vai ficar bem'. Ela estampa bandeiras nas sacadas, nos cartazes das crianças. A onda de solidariedade é muito forte entre os italianos e todos acreditam que isso vai passar logo. A Itália já se reergueu muitas vezes e vai sair mais forte desta guerra", comenta.

Preocupação com o Brasil 

Reginaldo não esconde sua preocupação com o Brasil, onde deixou familiares e amigos. Por isso, acompanha o tempo todo as informações pelos noticiários. Segundo ele, o Brasil precisa saber utilizar a vantagem de ter sido afetado mais tarde pelo vírus e com isso tomar medidas diferentes daquelas que não surtiram efeitos nos países já dominados pelo covid-19.

"O Brasil entrou no jogo já conhecendo o resultado, mas preferiu achar que é uma bolha e que é imbatível. Está repetindo o erro da Itália. Se os governantes e as pessoas não se conscientizarem que a situação é muito grave, vamos perder muitas vidas", analisa.

Saúde x economia

No Brasil, as ações em torno da pandemia deram início a uma polêmica e uma divisão de opiniões sobre a questão de fechar empresas e comércios, com o receio da crise econômica que se desenrolará com as medidas de isolamento. 

Reginaldo, que possui uma empresa brasileira de consultoria para processo de cidadania italiana chamada Bendita Cidadania, sabe que não escapará de turbulências econômicas, porém chama a atenção para o momento determinante pelo qual passa a saúde, que precisa ser o foco de todas as ações. "Eu sou um pequeno empresário no Brasil e sei o que vem pela frente. Mas desde o início preferi apostar na segurança dos meus colaboradores. A questão financeira você resolve depois, se reergue, mas a vida é uma só. Quando o governo decretou o fechamento do comércio, o caos já estava instaurado e todos entenderam que, apesar do clima de tensão, a medida dura era a melhor coisa neste momento. Aqui só funciona farmácias e supermercados. Algumas indústrias alimentícias ou de produtos essenciais receberam uma autorização para funcionar", revela. 

Para ele, o Brasil ainda tem tempo de evitar um colapso no sistema de saúde, mas para isso precisa impor medidas mais emergenciais. "A Itália foi muito branda nas punições no início. Depois ela precisou colocar o exército nas ruas, drones, controles de todos os tipos, multas pesadas, para a população respeitar o decreto. O Brasil precisa impor a ordem com energia suficiente para a população ficar isolada e evitar a contaminação em massa", opina.

O futuro

Reginaldo Maia prevê um futuro de complicações sociais e financeiras para Brasil e Itália, mas acredita no potencial das duas nações de se reerguerem. "Creio que o Brasil e a Itália não terão recuperação rápida no curto prazo, mas garantir a segurança das pessoas deve vir em primeiro lugar. Depois, com racionalidade, os países buscarão a sua reinserção competitiva no mercado. Brasil e Itália têm as suas reservas para situações de crise e saberão administrar isso. Não existe crise que dura para sempre", observa.

Para finalizar, o jornalista deixa seu recado para os brasileiros e, mais especificamente, aos araraquarenses. "O isolamento é a única arma para nos manter vivos e proteger quem amamos. É um trabalho de formiguinha e, se cada um fazer a sua parte, vamos sufocar esse vírus mais rápido", conclui.

 

 

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