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Experiências plenas e transgressoras

"Os dispositivos tecnológicos foram criados para facilitar nossas vidas e para que tenhamos mais tempo. Todavia, parece que a humanidade, no geral, tem insistido em fazer inúmeras coisas ao mesmo tempo"

Ler em mídias digitais ou no papel?

Digo que cada um deve proceder da maneira que lhe pareça mais confortável. O que importa realmente é que o ato da leitura seja completo. Nesse quesito, as experiências tendem a ser melhores em superfícies feitas de celulose.

O Kindle tem me ajudado muito em termos de rendimento. Ler em sua tela é algo bem agradável. De acordo com as necessidades ou preferências de cada leitor, é possível modificar a fonte do e-book tanto em estilo quanto em tamanho. Se o modelo for o Paperwhite, melhor ainda: dá pra ler no ônibus sem precisar acender a luz de leitura e incomodar um possível passageiro vizinho, já que a luminosidade da tela do dispositivo pode ser regulada. Desde que passei a usá-lo, tenho a seguinte certeza: Kindle é melhor que televisão.

O problema é quando me coloco a ler algo online. Tenho sérias dificuldades em manter a atenção no artigo escolhido – por isso, evito colocar muitos livros na memória do supracitado e-reader da Amazon. Quando dou por mim, várias janelas estão abertas e a sensação é de que não assimilei nada do que li. Quando desligo o computador ou recoloco o celular no bolso, sinto-me como se ainda não tivesse lido nada.

Há mais ou menos uns vinte dias, Joel Pinheiro da Fonseca, colunista do jornal Folha de S. Paulo, relatou sua sensação depois de passar uma semana somente se informando por notícias publicadas em meios impressos. O saldo, segundo ele, foi extremamente positivo. Claro: grande parte do que era lido já havia acontecido há algumas ou muitas horas. Porém, esse distanciamento temporal era favorável no sentido de ver análises mais lúcidas do que as proferidas no momento de cada acontecimento, em que as pessoas costumam vomitar opiniões no calor do momento.

Além da leitura do jornal ter sido mais proveitosa na questão do aproveitamento, creio que a grande sacada seja tirar um momento para se dedicar a uma única coisa: ler.

Os dispositivos tecnológicos foram criados para facilitar nossas vidas e para que tenhamos mais tempo. Todavia, parece que a humanidade, no geral, tem insistido em fazer inúmeras coisas ao mesmo tempo. A partir do momento em que tomo a decisão de me desconectar de tudo para apenas escolher um canto da casa e usufruir da leitura, essa experiência tende a ser a melhor possível. É como ir à estante, escolher um vinil do Milton Nascimento e colocá-lo no toca-discos. Algo bem diferente de me colocar a navegar pelas infinitas possibilidades do Spotify.

Negar a importância das mídias digitais seria algo tão anacrônico e absurdo quanto pregar a volta do regime militar. Contudo, num mundo ideal, seria legal se tirássemos pelo menos uma hora de nosso dia para consumir, sem correria, textos mais longos e reflexivos.

O papel ainda tem se mostrado a mais plena e transgressora maneira de fazer isso.

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