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Poucos livros para compor uma biblioteca

" Pela Todavia, saiu A república das milícias: dos esquadrões da morte à era Bolsonaro, do jornalista e pesquisador Bruno Paes Manso – vi alguém elogiar, no Twitter, o ritmo policialesco que embala a passagem de uma página a outra."

Entre 9 e 15 de novembro, será realizada a feira do livro da USP. Nela, as editoras comercializam seus produtos pela metade do preço. Dessa vez, por causa das restrições impostas pela pandemia, o evento se dará de forma virtual.

Caneta e papel na mão, começo a refletir sobre desejos que poderiam ser realizados a preços menos salgados. A editora Rocco acaba de lançar luxuosa reunião das cartas de Clarice Lispector, escritos em que a autora disserta sobre os mecanismos de sua obra. Pela Todavia, saiu A república das milícias: dos esquadrões da morte à era Bolsonaro, do jornalista e pesquisador Bruno Paes Manso – vi alguém elogiar, no Twitter, o ritmo policialesco que embala a passagem de uma página a outra.

Estou ponderando se devo incluir na lista Telégrafo visual: crítica amável de cinema, de David E. Neres, esse da Editora 34, quando me lembro da estante e das caixas abarrotadas de livros que decoram meu quarto. Lá, há títulos que muito provavelmente não darei conta de ler até o fim da vida.

Em “As aventuras do fotógrafo”, conto de Italo Calvino, Antonino tem a ideia de compor um catálogo de objetos que normalmente são evitados por retratistas. Passa dias dentro de casa, registrando as mesmas coisas (cinzeiros cheios de tocos de cigarro, a cama desfeita, uma mancha de umidade na parede) e percebendo como elas se modificam conforme a claridade se altera.

A partir do projeto de Antonino, imaginei um sujeito que decide selecionar poucos livros para compor uma biblioteca que o acompanhará pela vida inteira. São no máximo dez volumes, carregados para cima e para baixo, entre hotéis e pensões, casas e apartamentos. Ele leria, claro, coisas novas, todas emprestadas. Mas, acima de tudo, jamais deixaria de reler aquela dezena de edições amareladas, todas mantidas ao alcance de seu olhar.

Assim como Antonino, que gasta uma infinidade de filmes apontando a câmera para um mesmo objeto, perceberia, a cada releitura, que a experiência se modifica de acordo com a luminosidade do momento, revelando imagens que mostram diferentes facetas de uma única coisa.

Por fim, tomo uma decisão: em vez de Telégrafo visual, talvez fosse melhor inserir os três volumes de O Capital, editados pela Boitempo, entre minhas pretensões.

Luis Antônio
Luis Antônio
Jornalista. Formado em Ciências Sociais e Letras pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Mestre em Estudos Literários. Apresentador e editor do Jornal da Morada, da Rádio Morada FM 98,1
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