InícioEsporteMaurinho: O 1ª araraquarense em uma Copa do Mundo

Maurinho: O 1ª araraquarense em uma Copa do Mundo

Craque falecido em 1995 se destacou com as camisas de São Paulo, Fluminense e Boca Juniors

O Museu de Reminiscências Esportivas Paschoal Gonçalves da Rocha — no momento fechado por conta da pandemia do coronavírus — possui, em meio à sua exposição, um ítem marcante na história do futebol de Araraquara. Trata-se de um terno utilizado pela delegação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1954 na Suíça, competição que ficou marcada pela estreia da camisa amarela do Brasil, que após a derrota para o Uruguai na final da Copa de 1950, no Maracanã, decidiu aposentar a camisa branca. 

O terno foi utilizado pelo ex-jogador Maurinho, que foi o primeiro araraquarense a disputar uma Copa do Mundo. A vestimenta foi doada pela família do craque falecido em 1995. 

A façanha de Maurinho foi tão relevante para o esporte local que só foi repetida décadas depois pelo atacante Careca, o segundo araraquarense que conseguiu marcar presença em Copas do Mundo com suas participações em 1986 e 1990. Vale ressaltar que Maurinho, no entanto, não foi o primeiro araraquarense a chegar à Seleção, feito alcançado pelo zagueiro Luís Bento Palamone, que foi convocado para defender o Brasil no Torneio Sul-Americano de 1919 e 1922, em competições equivalentes à atual Copa América. 

Figurando até hoje no top-10 de artilheiros da história do São Paulo, Maurinho foi revelado no futebol amador de Araraquara e construiu uma história de sucesso no futebol brasileiro. Confira! 

 

O início

Mauro Raphael nasceu no dia 6 de junho de 1933 em Araraquara. Era filho de Marcílio Raphael e Mercedes Montagna, que antes de seu nascimento já viviam da agricultura e vieram para a Morada do Sol em busca de melhores oportunidades. Gostaram da cidade e passaram a morar no bairro São José.

Passou a infância jogando futebol com os amigos nos campos de terra do bairro e, ainda adolescente, passou a conciliar os estudos e o futebol com o trabalho de engraxate no Centro da cidade. Em 1947, começou a defender a equipe do Paulista Futebol Clube, time que em 1931 conquistou o título do primeiro Amadorzão disputado em Araraquara e que posteriormente se tornou o primeiro clube profissional da cidade. 

Jogo histórico no Estádio Municipal

Mesmo com a pouca idade, Maurinho encantava dentro de campo com um futebol rápido, habilidoso e objetivo. E sua vida começou a mudar no dia 23 de julho de 1950, quando Araraquara recebeu um jogo comemorativo entre Paulista e Palmeiras. Naquele momento, poucos meses após a fundação da Ferroviária em 12 de abril, o Paulista era o principal time da cidade e contava com nomes como Madalena, Laxixa, Tiana, Élvio e, é claro, o menino Maurinho, que já tinha seu nome comentado entre os amantes do futebol da cidade. Do lado do Verdão, desembarcaram em Araraquara nomes importantes como Oberdan Cattani, Fiúme, Turcão e Rodrigues.

O público araraquarense compareceu em peso ao Estádio Municipal Tenente Siqueira Campos — que atualmente pertence ao Clube Araraquarense — e acompanhou um confronto cheio de emoção. A qualidade individual do time da capital resultou na vitória por 5 a 3, porém o grande nome daquela partida foi Maurinho, na ocasião com 17 anos de idade, que marcou os três gols da equipe araraquarense. O jovem passou aquela noite em claro por tanta emoção vivida naquele dia inesquecível.

Deixando Araraquara

Sua qualidade com a bola nos pés rapidamente resultou em oportunidades e a primeira delas foi um convite para treinar entre os juvenis do Corinthians, porém a avaliação não ocorreu como o esperado, já que ele mal teve tempo de mostrar seu potencial. Entrou em campo apenas no final do treino, mal teve tempo de tocar na bola e ainda foi alvo da gozação de torcedores que presenciaram a atividade. 

Voltou para Araraquara abatido, porém, na mesma época, o Guarani de Campinas convidou o zagueiro Guilherme, do Paulista, para realizar um período de testes. Guilherme era inibido e pediu para levar o amigo Maurinho com ele. O período de avaliação não foi proveitoso para o zagueiro, que desistiu de sua chance. Porém Maurinho seguiu no Bugre, passou um período maior sob observação e foi alvo de investidas do XV de Piracicaba. A diretoria bugrina negou a oferta e integrou o craque em seu elenco em 1951. 

Fez história no São Paulo

Em sua primeira atuação no Paulistão com a camisa do Guarani, Maurinho ganhou evidência e recebeu o apelido de Flecha. Seu futebol despertou o interesses de grandes clubes de São Paulo e do Rio de Janeiro. Quem venceu a concorrência pelo jovem atleta foi o São Paulo, que acertou sua contratação na primeira semana de 1952, quando ele ainda tinha 18 anos de idade.

A identificação com a camisa do Tricolor foi imediata e por lá Maurinho ficou por oito temporadas e é, até hoje, o 9º artilheiro da história do São Paulo, com 135 gols marcados em 343 jogos (203 vitórias, 76 empates, 64 derrotas).

Tarde das Garrafadas

O araraquarense sagrou-se campeão paulista pelo São Paulo em 1953, porém seu momento mais memorável pelo clube ocorreu na final do Paulistão de 1957 contra o Corinthians. O Tricolor vencia por 2 a 1 e o jogo estava acirrado, quando ocorreu um rápido contra-ataque e Maurinho saiu de frente com o goleiro Gylmar dos Santos Neves. O atacante teve tempo de pedir para o arqueiro escolher um canto e deu um drible desconcertante antes de tocar para a rede e dar números finais ao jogo. 

Os jornais da época relatam que Maurinho teria provocado o goleiro, que correu atrás dele para tirar satisfações. Ao mesmo tempo, os atletas corintianos protestavam com a arbitragem, pedindo impedimento. A torcida alvinegra, revoltada, impediu a volta olímpica do time campeão, o que gerou grande tumulto e o episódio ficou conhecido como 'A Tarde das Garrafadas'.

Um araraquarense na Copa

Logo em suas primeiras temporadas pelo Tricolor, Maurinho se destacou e foi convocado para servir a Seleção Paulista. Brilhou e em 1953 teve sua primeira convocação para defender a Seleção Brasileira. Pelo Brasil, ele disputou 14 jogos e marcou quatro gols. Seu reconhecimento foi consolidado com a convocação para a Copa do Mundo de 1954 na Suíça.

No Mundial, Maurinho foi titular no lendário confronto do Brasil contra a Hungria de Puskas, em jogo que terminou com a derrota brasileira por 4 a 2. Mesmo com a eliminação, o jogador sempre comemorou a façanha de representar seu país em uma Copa do Mundo. O araraquarense só não teve mais oportunidades na Seleção porque tinha pela frente uma lista de fortes concorrentes em sua posição, como Garrincha, Julinho Botelho e Cláudio.

Passagem por Araraquara

Em Araraquara, a Ferroviária se desenvolvia com o amparo da estrada de ferro. Maurinho, no entanto, não chegou a vestir a camisa grená em sua carreira. Ele voltou a Araraquara como adversário em apenas uma oportunidade, e saiu vencedor.

Em 14 de abril de 1957, foi dele o gol da vitória por 1 a 0 do São Paulo sobre a Locomotiva na Fonte Luminosa em jogo válido pelo Paulistão. Ele já havia enfrentado a equipe araraquarense em 19 de setembro de 1956, no Pacaembu, onde o Tricolor levou a melhor por 3 a 1.

Outros times

No segundo semestre de 1959, Maurinho se transferiu para o Fluminense, time pelo qual marcou 40 gols em 119 jogos. Integrou a escalação ao lado de Telê Santana, Paulinho, Valdo e Escurinho no ataque que sagrou-se campeão carioca de 1959 e campeão do Torneio Rio-São Paulo de 1960.

Alguns desentendimentos com o técnico Zezé Moreira resultaram em um período de instabilidade para o araraquarense no Flu. Assim, ele deixou clara sua vontade de retornar ao futebol paulista. Seu desejo, no entanto, não prevaleceu e a diretoria do time carioca aceitou uma proposta do Boca Juniors da Argentina. Assim, ele foi apresentado na Bombonera em 1961 e no ano seguinte conquistou o título do Campeonato Argentino.

Em 1964, retornou ao Brasil para defender o Vasco da Gama, porém sua passagem pelo cruzmaltino foi curta, já que logo em seguida decidiu voltar ao Fluminense, onde sofreu uma séria contusão no joelho pouco tempo após sua chegada. A gravidade da lesão o levou a desistir da carreira aos 31 anos de idade.

Vida pessoal

Mesmo ano em que foi apresentado pelo São Paulo, 1952 também foi especial para Maurinho por outro motivo, já que foi quando ele se casou com sua esposa Doralice, em cerimônia realizada na Matriz de São Bento em Araraquara. O casal teve três filhos: Junior, Márcia e Mônica.

Fã de Garrincha e Canhoteiro, ambos com quem teve a oportunidade de dividir os gramados, o araraquarense tinha como hobby principal a pescaria e apreciava a música de Orlando Silva, Helena de Lima, Elisete Cardoso e Alcione.

Após pendurar as chuteiras, Maurinho viveu em São Paulo, onde faleceu no dia 28 de julho de 1995, aos 62 anos de idade.

(Fontes: Alessandro Bocchi, Tetê Viviani, livro 'Araraquara, Futebol e Política', do escritor Luís Marcelo Inaco Cirino)  

 

Confira abaixo algumas fotos da carreira de Maurinho.

 

 

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