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Os cães rejeitados na fila da adoção

Por: BBC Brasil

Os filhotes abandonados que chegam ao Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) da Prefeitura de São Paulo nem chegam a esquentar a coleira: são todos adotados quase que imediatamente.

Enquanto famílias vêm e vão levando seus novos bichinhos – filhotes claros, alegres e peludos – Plutão descansa o focinho grisalho nas patas, alheio ao movimento do outro lado da porta de vidro de seu canil.

Com 14 anos, glaucoma em seu único olho e começando a ficar surdo, Plutão reúne a maioria das características que dificultam as chances de um cão sem dono conseguir um lar: é preto, velhinho, doente e tem uma deficiência.

Manso e sociável, ele gosta de adultos e crianças e se dá bem com outros cães, mas está no CCZ há cinco anos sem conseguir agradar alguém o suficiente para ser levado para casa.

A vida de Plutão demonstra como funciona a fila da adoção: as pessoas têm necessidades e expectativas em relação aos bichos de estimação. Os que saem primeiro são os que se encaixam melhor nesse ideal de pet – em geral, quanto menor, mais jovem, mais claro e mais peludinho, maior a chance de arrumar um lar.

"As pessoas vêm procurando filhotes", diz o veterinário Rafael Birkeland Carvalho, um dos responsáveis pelo cuidado com os cães do CCZ.

A maioria dos bichos no espaço e em ONGs que cuidam de cães, no entanto, não é nem jovem nem clarinha.

No abrigo da prefeitura, os que ficam anos esperando por um lar – e muitas vezes acabam morrendo ali – são de porte grande ou velhinhos e doentes.

Muitos têm deficiência. Outra parte também apresenta problemas de comportamento: são agressivos ou desconfiados por terem sofrido traumas no passado.

Mas às vezes quem chega querendo um filhote acaba se apaixonando por um adulto.

"A melhor adoção que fiz foi de um pai que tinha um filho com deficiência e queria um filhote para lhe fazer companhia. Quando mostrei um adulto que tinha passado por uma operação e precisou retirar o pênis, ele quase chorou. Levou na hora", diz Carvalho.

O veterinário conta que nos últimos tempos têm aparecido algumas pessoas interessadas em adotar os cães com deficiência.

"Às vezes chega gente com essa intenção de ajudar e leva os que têm deficiência. Mas os velhinhos continuam ficando para trás."

"As pessoas esquecem das vantagens de adotar um cão adulto", diz Mônica Di Ciomo, da ONG Adote um Focinho. Eles não choram durante a noite e se adaptam mais rapidamente aos costumes e regras da casa.

Os velhinhos, por sua vez, costumam latir menos. "Quando os cães idosos dão sorte de conseguir um lar, em geral são levados por pessoas mais velhas, que têm menos facilidade de brincar e levar para passear um cão jovem e cheio de energia", explica o veterinário do CCZ.

Confira, a seguir, um "ranking da adoção" – a ordem em que os cães costumam ser adotados, segundo os entrevistados:

 

1. Filhotes

São os primeiros a encontrar um lar. "Os brancos e de olhos claros saem antes, depois os marrons e mesclados e, por último ,os pretinhos", diz Di Ciomo, do Adote um Focinho.

A ONG acabou de resgatar uma ninhada de quatro bem pequenos, todos escuros. "Se tiver um branquinho numa ninhada como essa, ele sempre sai primeiro", conta.

 

2. Jovens de porte pequeno e os de raça

"As pessoas querem bichos que se adaptem a apartamentos, então os mansos de porte pequeno são os preferidos depois dos filhotes", explica o veterinário do CCZ.

Os cães de raça da moda – como golden retriever, labrador, shih-tzu, e lulu da pomerânia – também são muito procurados.

"As pessoas compram, não dão conta de cuidar ou se mudam e abandonam. Quando a gente resgata, mesmo os maiores ficam pouco tempo", diz Di Ciomo.

 

3. Jovens de porte médio e pelo claro

O vira-lata Batata foi adotado filhotinho e depois devolvido. "A família disse que não sabia que filhote dava tanto trabalho", diz Di Ciomo.

Mas por ser considerado bonito e não muito grande, a voluntária diz que logo ele deve achar um novo lar.

 

4. Jovens de porte médio e pelo escuro

A ordem é a mesma que a dos filhotes: os brancos e beges são adotados primeiro, o mesclados depois e os pretos, por último.

 

5. Jovens e adultos de porte grande

Os cachorros de porte grande são maioria no CCZ.

"Nós lidamos com controle de zoonoses. Então quando um cachorro vem para cá (por esse motivo), é porque estava sendo agressivo ou porque era uma ameaça – estava doente e podia ser contagioso, por exemplo. Claro que, uma vez aqui, nós damos todo o cuidado", diz o veterinário.

Desde 2008, uma lei proíbe que o abrigo sacrifique animais que não tenham doenças terminais. A exceção são os agressivos a ponto de serem impossíveis de lidar. "É raro. Nos cinco anos em que estou aqui, só três foram sacrificados por esse motivo", conta.

"Nós fazemos todo o trabalho de adaptação. A maioria estava em uma situação de estresse e se mostra bonzinho em condições normais."

Serena é um exemplo. Grande e com uma ninhada recém-nascida, ela estava sendo agressiva com pessoas na rua, por isso foi levada ao CCZ.

Seus filhotes foram todos adotados, mas ela ficou. Depois de castrada, se mostrou dócil e mansa, mas espera um lar há cinco anos.

 

6. Com deficiência

Mesmos que muitas vezes não precisem de nenhum cuidado especial, cachorros com deficiência "intimidam" possíveis adotantes, segundo os cuidadores.

Com três patas, Ana foi uma das que deram sorte. Foi adotada em julho pela médica Giuliana Sigolo Neves – que já tinha um cachorro sem uma das patas. Mas antes disso ficou cinco anos no abrigo da ONG Adote um Focinho.

"Ela nem sabe que tem deficiência, pula, brinca e apronta normalmente", diz a nova dona.

 

7. Velhinhos

Cães idosos dão pouco trabalho – latem menos e não precisam gastar tanta energia. Mas a perspectiva de ficar com eles pouco tempo, lidar com a morte e com problemas de saúde afasta algumas pessoas.

"Penso que a vida dele nesses últimos anos foi melhor que nos anteriores", relata a bancária Thalise Carneiro. Ela adotou um labrador de 12 anos que morreu depois de três anos com ela.

 

8. Com problemas crônicos de saúde

Animais com problemas de saúde precisam de um dono que esteja disposto a dar cuidados especiais. Em alguns casos é só uma ração diferente. Em outros, eles precisam de idas frequentes ao veterinário, remédios e, possivelmente, cirurgias.

 

9. Bravos e de raças consideradas agressivas

Muitos pitbulls são abandonados e, por gerarem medo, acabam indo parar no CCZ. Boa parte deles é mansa e muito dócil, mas mesmo assim acaba ficando para trás, segundo os cuidadores.

Já os mais bravos, só acham um dono quando – muito raramente – aparece alguém procurando por um cachorro para guarda.

 

10. Com muita dificuldade de mobilidade

"Temos uma que tem problema na coluna e mal consegue ficar em pé. A gente sabe que terá que cuidar dela até o fim da vida", diz Rafael Birkeland Carvalho.

 

11. Com personalidade difícil

Cachorros que passaram por traumas e têm o comportamento errático e imprevisível podem ser um desafio até para os donos mais dedicados.

Dependendo do caso, muitas vezes os abrigos nem colocam os bichos assim para a adoção.

 

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