InícioEsporteVicente Baroffaldi: O guardião das memórias afeanas

Vicente Baroffaldi: O guardião das memórias afeanas

Amor pelo futebol direciona os rumos da vida do escritor e historiador araraquarense

Ele tem doze livros publicados nos últimos dez anos, sendo oito deles dedicados à Ferroviária. Quando se fala em história e estatísticas da Locomotiva, Vicente Henrique Baroffaldi é a pessoa certa para o assunto. E a credibilidade do escritor e historiador araraquarense não é por acaso, já que o conteúdo acumulado desde 1959 se transformou em uma fonte inesgotável de informações. A qualidade de seu trabalho se explica também pelo amor que sente pelo time grená e pelo futebol de um modo geral.

Esse sentimento em torno do futebol surgiu na infância e posteriormente foi o responsável pela criação de um time amador, o XV de Novembro do Carmo, que inspirou um de seus livros. Além da Ferroviária e do futebol amador, o escritor também já escreveu uma obra inspirada no São Paulo Futebol Clube, seu outro time do coração. Apenas uma de suas publicações não possui o enfoque esportivo: em 'A Deusa Vida' e 'Solidão Cósmica', dois livros em um, o autor apresenta relatos e textos breves, brotados de uma mente culta e fértil, atenta a todos e a tudo de inusitado à sua volta.

Além de todo o registro publicado em seus livros, o escritor também aproveita as vantagens da internet para se aproximar cada vez mais dos torcedores e dos ex-jogadores relatados em suas obras, que interagem, colaboram com dados e ao mesmo tempo se mantêm conectados à história afeana, criando-se assim um grande canal de conhecimento mútuo.

Em entrevista ao Portal Morada, Vicente Baroffaldi falou sobre sua trajetória e emoções vividas dentro e fora dos âmbitos futebolísticos e literários. Confira!

O início

Vicente Henrique Baroffaldi nasceu em Araraquara no dia 28 de julho de 1947. É filho de Paschoal Baroffaldi, servidor público estadual, motorista do D.E.R. e da Polícia Rodoviária, falecido em 1968 aos 52 anos de idade. Sua mãe é Luiza Lúcia Martello Baroffaldi, doméstica, falecida em 2013 aos 88 anos. Seus pais lhe deram cinco irmãs: Eda Maria, Neusa Maria (nascida na data de fundação da AFE, em 12 de abril de 1950), Marly, Marisa e Ana Lúcia. 

Cresceu no bairro do Carmo, onde morou até os 46 anos da idade. Seu primeiro contato com o futebol ocorreu aos 10 anos, com a turma de garotos da vizinhança. "Capinamos um terreno na avenida 15, entre ruas 15 e 16, próximo ao D.E.R. Colocamos traves e passamos a jogar, descalços, ouvindo reclamações dos vizinhos quando a bola era chutada em seus quintais; um deles era feroz. Nas férias, jogávamos o dia todo. O que perdi de 'tampas' de dedões… Como eu me defini como são-paulino e jogava de beque central, me deram o apelido de Mauro [alusão a Mauro Ramos de Oliveira], unicamente pela posição, claro", relembra Vicente. 

O garoto estudou o ensino primário na Escola Antônio Joaquim de Carvalho (Anjoca), o ginasial na Escola Comercial Senac, o científico no Colégio São Bento e cursou faculdade de administração na Uniara. Logo na adolescência descobriu seu talento para os números. "No quarto ano primário, ganhei um livro com dedicatória da professora Maria de Lourdes Salinas por ter tirado nota máxima em aritmética durante oito dias seguidos. No ginasial, adorava as aulas de matemática da professora Nabia Rached Micelli. No colegial e faculdade, amava as aulas de matemática do professor Ulisses dos Santos Ribeiro. Foram os meus grandes incentivadores", revela. 

Futebol no coração

No dia 15 de abril de 1959, Vicente, com 12 anos de idade, foi levado pelos pais até o Estádio da Fonte Luminosa, onde vibrou com cada lance do empate por 3 a 3 entre Ferroviária e Vasco da Gama, em jogo comemorativo que inaugurava os refletores do estádio. Naquele dia, a Fonte se tornou literalmente luminosa e a Ferroviária entrou definitivamente em seu coração.

Mas o jogo mais emocionante que acompanhou na vida não envolveu o time grená, mas sim a camisa amarelinha da Seleção Brasileira. Em 9 de julho de 1972, o Brasil encarou Portugal no Maracanã pela final da Taça Independência (Minicopa) diante de um público de 99.138 pessoas. "Aos 44 minutos do segundo tempo, Jairzinho fez 1 a 0 e o Brasil foi campeão. Alegria contagiante da galera. Eu, meu primo Henrique e o colega de serviço Bento dos Santos [o Bento Vaca, árbitro de futebol] vibramos muito", relata.

Entre os jogadores que ele pôde ver de perto, destaca um em especial: "Tive a felicidade de ver em ação, ao vivo, o Rei Pelé", se orgulha.

Ligação com o futebol amador

O amor pelo futebol era tanto que Vicente fundou um time de várzea: o XV de Novembro do Carmo, que foi tema de um dos seus livros. "O time realizava partidas amistosas na cidade e em fazendas. Para não atrapalhar o time principal, eu era o treinador, mas jogava no 'segundinho'. Joguei também no time da ACEA, como lateral-esquerdo. Num jogo contra o scratch do Rádio da Bandeirantes, em 1970, na Fonte, recebi uma flâmula de Fiori Gigliotti, que também era lateral-esquerdo. Fiquei emocionado", conta. 

Uma trajetória de muito trabalho

Dos 16 aos 20 anos, Vicente Baroffaldi trabalhou na Sucursal dos Diários Associados, que ficava na Rua São Bento, onde hoje funciona uma agência do Itaú. Era secretário, selecionava as notícias importantes da cidade e as enviava por malote, via furgão, para o Diário de São Paulo, na capital paulista. "Meu primeiro patrão, Francisco Parisi, agente da Sucursal, foi um dos signatários da ata de fundação da Ferroviária", conta ele, que durante quatro meses teve uma banca de jornais e revistas na entrada lateral do Mercado Municipal, enquanto esperava chamada do serviço público.

De 17 de junho de 1968 a 4 de julho de 2000, ele trabalhou no Serviço Especial de Saúde de Araraquara, o SESA. Atuou 32 anos como servidor da USP, área administrativa, sendo metade desse tempo como auxiliar assistente de administração e metade como chefe da seção de administração geral.

Os trabalhos nunca o impediram de desenvolver atuações paralelas relacionadas ao futebol. Integrou a Associação dos Cronistas Esportivos de Araraquara (ACEA) de 1965 a 1986. "Quando comecei na ACEA, a entidade era presidida por Mário Boschiero, um senhor de fino trato e educadíssimo, que trabalhava no D.E.R. Integrei comissões organizadoras de inúmeros campeonatos de base promovidos pela ACEA. Também fui diretor da Liga Araraquarense de Futebol de 1975 a 86, como secretário geral, presidente e vice-Presidente, nessa sequência. E fui diretor de divulgação da CCE/Fundesport, gestão Gaeta, trabalhando diretamente com o Professor Ricardo Portari", comenta. 

Baroffaldi também colaborou com jornais de Araraquara. Começou no jornal O Diário desde a edição nº 1, em 1965, e posteriormente escreveu para O Imparcial, Folha da Tarde e Jornal da Manhã. "Em O Diário, de Roberto Barbieri, eu era responsável pela página do futebol profissional sob o título 'O Futebol em Pauta'. No Jornal da Manhã, respondia pelo esporte amador. Colaborei ainda com José Roberto Fernandes em 1983, divulgando diariamente o esporte amador pelas rádios Morada e Cultura", recorda. 

Vida de escritor

Vicente sempre foi colecionador das revistas 'A Gazeta Esportiva Ilustrada', 'Revista do Esporte' e 'Placar'. Sua fome de informação também teve início logo cedo. "A partir de 1959, passei a preencher as tabelas dos campeonatos paulista e carioca. Até hoje faço isso! O conteúdo esportivo que armazenei ao longo de todo esse tempo é vasto e está espalhado pela casa", revela. 

Aos longos de todo esse tempo, ele juntou um amplo e apurado conteúdo esportivo. O levantamento estatístico voltado para a Ferroviária foi a base de seu primeiro livro, 'Ferroviária em Campo – Seis Décadas de Futebol da Ferroviária de Araraquara', lançado em 2010. Era sua estreia como escritor.

Desde então, seus lançamentos se tornaram frequentes e foram mais 11 livros publicados em um espaço de nove anos: 'XV – O Alviceleste do Carmo' (2011), 'São Paulo Internacional' (2012), 'A Deusa Vida/Solidão Cósmica' (2012), 'O Futebol na Terra do Sol' (2013), 'Ferroviária em Campo: Breviário Grená' (2014), 'Ferroviária em Campo: Tricampeã do Acesso' (2015), 'Ferroviária em Campo Contra os Grandes Clubes Paulistas' (2016), 'Ferroviária em Campo: Feitos e Exaltações' (2017), 'Ferroviária no Paulistão – Campanhas, Formações e Artilheiros' (2018), 'Todos os dias com ela' (2018) e 'O Melhor Campeonato Paulista da Ferroviária – O Esquadrão Fantasma' (2019). Em todas as obras, ele faz questão de destacar a participação do amigo Paulo Micali, que sempre o auxiliou na pesquisa e produção dos conteúdos.

Paralelamente, Vicente abastece seu blog 'Ferroviária em Campo' – que tem mais de 1.300 posts – e também faz muito sucesso entre os torcedores com sua página no Facebook, com conteúdo atualizado o tempo todo. Ele revela que toda sua produção de livros e posts é desenvolvida de forma simultânea. "O trabalho é diário, uma vez que escrevo para blog e redes sociais, tudo sob o título 'Ferroviária em Campo' e em parceria indispensável com Paulo Micali desde 2010. Acaba sendo o material utilizado para subsidiar a produção de livros. Começo desenvolvendo um tema, mudo para outro, vou para um terceiro… e de repente me defino por um quarto. Depende também do momento. O 'Tri do Acesso' foi definido quando a Ferroviária sagrou-se campeã da A2 em 2015", salienta o historiador, que já tem outra obra em produção, porém ainda não tem uma perspectiva de quando será o lançamento.

Quem quiser adquirir algum dos livros do escritor pode entrar em contato por sua página no Facebook

Sucesso na internet

Os posts de Baroffaldi no blog e nas redes sociais encurtam a distância dos torcedores com a Ferroviária e também os fazem matar a saudade de nomes que ajudaram a construir o esporte local. Ele apresenta estatísticas do clube, datas e comemorações que ficaram marcadas na história, retrospectos de confrontos, personagens ligados ao time que fazem aniversário, passagens futebolísticas curiosas e um vasto levantamento que auxilia constantemente o trabalho da imprensa esportiva de Araraquara.

Ele conta que a internet, além de ser uma ferramenta essencial de divulgação, também colabora para que ele tenha acesso a informações de pessoas que ele não teria contato de outra forma. "É fundamental. Sem a internet eu teria enormes dificuldades para produzir, com fertilidade de informações e colaborações preciosas dos amigos, o que tenho produzido em livros juntamente com o Micali. Interagir com enorme quantidade de esportistas, por meio eletrônico, se converte num tesouro valiosíssimo. O mundo virtual me fascina", analisa.

Isolamento social

Atualmente, a pandemia do novo coronavírus ocasionou a paralisação do futebol brasileiro e com a Ferroviária não foi diferente. Vicente se junta aos torcedores que sofrem com a saudade de acompanhar as partidas na Fonte Luminosa. "Sinto demais a falta do futebol, minha grande paixão. Mas o isolamento social não me abala, dada a minha forma habitual de vida, pautada pela introspecção e muita leitura", ressalta. 

Assim, ele aproveita para deixar uma mensagem aos torcedores que vêem nele uma fonte de inspiração para fortalecer o vínculo com a Locomotiva e com o futebol de uma forma geral. "Às pessoas que, eventualmente, possam admirar o meu trabalho, dirijo um 'muito obrigado'. É alentador saber que ele repercute e alcança a atenção e a sensibilidade de outras pessoas. Sou imensamente grato por isso. Ainda mais por sentir que temos uma afinidade que reputo como sublimadora: gostamos de futebol e amamos a Ferroviária", finaliza o escritor.

 

Confira abaixo fotos da vida de Vicente Baroffaldi.

 

 

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