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Quatro mentiras que você já ouviu sobre o serviço público

E algumas informações que podem ajudar a formar seu ponto de vista com mais propriedade

O senso comum é implacável com servidores públicos. Mesmo diante de exemplos de eficiência, a maioria das pessoas não se livra do pensamento de que servidor público não gosta de trabalhar. Para ficar em dois exemplos: as operações da Polícia Federal, tão comemoradas, são realizadas por servidores públicos e as melhores notas do Ensino Médio, superiores até que as obtidas por alunos de escolas particulares, são dos alunos do Instituto Federal, escola pública, com professores e demais funcionários todos servidores públicos.

No âmbito local, você tem, por exemplo, o serviço de controle de fauna sinantrópica de Araraquara que tem sua equipe reconhecida nacionalmente por institutos como o Adolfo Lutz e o Butantã, os socorristas do SAMU que são muito elogiados, e tantos outros servidores cujas histórias não aparecem (que eu levaria muitas páginas nomeando e descrevendo), mas que cumprem com dedicação sua função – e, acredite, são maioria – e até os que chegam a adoecer por causa disso.

Porém, muita gente ainda pensa e, pior, emite opinião baseada nesse pensamento, que o problema do serviço público é o servidor. E, como todas as generalizações, essa também é burra.

Neste curto texto, apresento algumas considerações sobre as principais mentiras que você já ouviu sobre o serviço público e proponho reflexões.

 

  1. Serviço público não funciona por causa dos servidores – A responsabilidade pela eficiência do serviço público não pode ser jogada nas costas apenas do servidor. As chefias têm um papel fundamental na condução e na execução do serviço. Chefias qualificadas/bem preparadas, além de transmitir o caminho das pedras para uma execução adequada, têm mecanismos para cobrar que o serviço seja bem feito. Por outro lado, chefias sem qualquer relação com a área que comanda, chefias por apadrinhamento político, são determinantes para a ineficiência do serviço. O que foram aqueles anos terríveis das Vigilâncias em Saúde de Araraquara, com as maiores epidemias da história? Chefias desqualificadas e coniventes com “vagabundagem” e serviços mal feitos são majoritariamente as responsáveis pela deficiência do serviço. E nunca são punidas. E a chefia é, necessariamente, uma escolha do governo. Portanto, a questão não é apenas “o serviço público”, mas também (e principalmente) “a condução do serviço público” por determinado governo. Quando o serviço público não funciona (de maneira crônica), é sempre por causa da estabilidade ou de uns ou outros servidores “encostados” (com conivência da chefia), ou muito mais por incompetência de gestão?

 

  1. O problema do serviço público é a estabilidade dos servidores – A estabilidade no serviço público não dá ao servidor o direito de não trabalhar corretamente. O servidor tem obrigação de prestar serviço de qualidade e cabe à chefia fazer com que isso ocorra. Se existem servidores “encostados”, é por incompetência e conivência da chefia. Todo trabalhador CLT tem estabilidade, a diferença é que no serviço público toda demissão tem que ser precedida de sindicância (que apura a autoria) e processo administrativo (que apura o fato e determina a punição). Seria até justo. Porém, o problema é que esses mecanismos têm seus objetivos desviados pelos governos, que utilizam-nos para punir os adversários políticos, em vez de zelar pelo serviço público. O problema, portanto, é a estabilidade ou a má gestão?

 

  1. A iniciativa privada é mais eficiente porque tem mais agilidade para executar serviços – A iniciativa privada tem mais agilidade em alguns casos por que tem menos controle, menos burocracias para cumprir. Porém, vamos pensar qual o motivo disso? O Estado precisa ter mais zelo e burocracia com suas contas por se tratar de dinheiro público. Tem que ter mais controle, muito mais. Tem que ser assim mesmo. A questão que deve ser destacada é que a iniciativa privada sempre vai ter lucro e, quando ela está associada ao Estado, parte desse lucro vem do dinheiro público. É o dinheiro dos impostos servindo para enriquecer alguém. Isso é totalmente questionável. Por que uma empresa consegue lucrar numa atividade que o Estado não consegue sequer gerenciar sem lucro? Há uma clara manobra repetida à exaustão por governos de todos os espectros políticos de sucatear propositalmente alguns serviços de interesse da iniciativa privada para depois entregá-lo a ela. Esse deve ser o debate. Em Araraquara isso ficou muito claro com o transporte coletivo no caso da CTA e está se repetindo sob nosso nariz com o Departamento Autônomo de Água e Esgoto (Daae) e com o pedágio municipal.

 

  1. Privatiza que melhora – O serviço público tem que prevalecer à iniciativa privada principalmente em setores estratégicos, como no caso dos municípios em relação à preservação ambiental. A questão dos resíduos sólidos é um exemplo claro. Do ponto de vista ambiental, o Estado tem que pensar em reduzir a geração de resíduos. Entretanto, para a iniciativa privada, o lucro é maior quanto mais lixo for produzido. Inevitavelmente, vai haver um conflito de interesses. Privatizar ou reduzir o poder do Estado só favorece o lucro de alguém e não o bem estar da população. Por mais que haja problemas e corrupção no Estado, ainda assim nele o poder emana do povo, enquanto na iniciativa privada, além de haver corrupção na mesma proporção ou maior do que no Estado, não há qualquer compromisso dela com a população, apenas com o lucro, mesmo que isso custe a vida das pessoas. Você paga plano de saúde? Está satisfeito com o serviço privado? E quem não pode pagar? Há muito o que se debater.
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