Jair Bolsonaro foi eleito – e avalizado – pela lógica ultraliberal de Paulo Guedes, seu super Ministro da Economia reconhecido pelos negócios de sucesso que fez no sistema financeiro. A ala liberal tupiniquim – termo para conseguir identificar esse grupelho que comanda o Brasil há décadas – não queria o ex-Capitão, preferia, em primeiro momento, Geraldo Alckmin do PSDB e aceitava Fernando Haddad, professor do INSPER – maior escola do liberalismo no país – e ex-prefeito de São Paulo. Mas, Jair, conseguiu se impor e foi eleito.
Mas, agora como Presidente da República, contrário a todo o discurso ultraliberal de Paulo Guedes e da maioria de sua equipe, cria, em 20 de novembro de 2019, a primeira estatal desde 2013 e de seu governo, a NAV Brasil Serviços de Navegação Aérea. A NAV será responsável pelo controle aéreo do Brasil, substituindo a Infraero que foi desmantelada pelos governos de Dilma Rousseff, Michel Temer e, em conclusão, de Bolsonaro com a venda de ativos, de janeiro a setembro, que totalizaram R$ 96,2 bilhões (programa de desinvestimento que incluiu vendas de subsidiárias como da BR Distribuidora e concessões de aeroportos, por exemplo). E todos nós sabemos que, desde 2014, estamos sob ajustes fiscais seguidos e os cortes realizados por Levy, Meirelles e Guedes são para conter o, questionável, “descontrole” fiscal do Estado e não para o investimento público – atualmente o menor da nossa história democrática.
Mas se tínhamos a Infraero, criada pelo regime militar que é sempre ovacionado pelos eleitores de Bolsonaro, porque da NAV? Oras, PT, PMDB e Aliança Pelo Brasil disputam apenas o simbólico da política e não o conteúdo, que é o programa econômico. Estes governos privatizaram alguns e concederam à iniciativa privada outros aeroportos por todo o país. No entanto, como é óbvio e lógico, o setor privado quer apenas o “filé” do setor e deixou todos os aeroportos não lucrativos na mão da União. Por isso, a Infraero precisou deixar de existir e outro instrumento institucional, a NAV, necessita ser criado para administrar os aeroportos nacionais não requeridos pelo setor privado. A Infraero, como a maioria das empresas públicas, mantinha uma lógica muito simples, controlava o mercado de aeroportos para poder fazer a redistribuição estratégia de recurso financeiro, ou seja, os aeroportos de alta lucratividade bancavam aqueles que não conseguiam se sustentar, dessa forma, você equilibra a oferta de infraestrutura em todo o território nacional.
A privatização ou a concessão deve ser vista como instrumento de gestão, em outras palavras, não há necessidade de demonizar a parceria da Administração Pública com o setor privado. No entanto, quando tratamos de Brasil, de suas necessidades e prioridades, é preciso alocar no centro do processo decisório a nossa realidade e construir uma parceria com empresários que não abra mão da qualidade, tão pouco da responsabilidade com o país. Estas privatizações e concessões de aeroportos deveriam ter assimilado todos os aeroportos, esses seria o papel do Estado: impor ao setor privado que administre sucessos, mas também aquilo que é indispensável para a sociedade. Buscando, assim, o equilíbrio que a Infraero gestava, do contrário o desequilíbrio será o resultante.
Além do mais, o Governo Bolsonaro e sua equipe não pensaram em construir uma saída para os milhares de funcionários públicos, concursos e regidos pela CLT, que estavam destinados à Infraero. Ou seja, a NAV, vinculada ao Ministério da Defesa, surge também como forma de enquadrar esses funcionários em um novo órgão público. Imaginem vocês o custo dessa operação para o Estado brasileiro, sendo que a estimativa mais baixa aponta para 2 mil empregados – o processo ainda vai se iniciar. Significa que a NAV nasce para administrar aeroportos que não dão lucro tendo uma folha de pagamento imensa, para além de ideologias e tomando a responsabilidade com a coisa pública como norte, é preciso afirmar, categoricamente, que o Governo Bolsonaro é um poço de irresponsabilidade.
Enfim, criamos uma empresa pública, no governo ultraliberal, para gestar os aeroportos que não dão lucro; oferecemos à iniciativa privada os aeroportos prontos e com alta lucratividade; assumimos o passivo trabalhista; e o ganho objetivo com a venda de ativos foi para o – eterno – problema fiscal do Estado, não para reinvestir no setor e sustentar as demais organizações sob guarda estatal. Nada mais simbólico para caracterizar o (neo)liberalismo tupiniquim. Quais, imaginem vocês, as consequências em curto, médio e longo prazos?