InícioEsporteOrselli: O símbolo da natação de Araraquara

Orselli: O símbolo da natação de Araraquara

Confira a trajetória do nadador que não se cansa de fazer história

Ele já faturou mais de mil medalhas, já quebrou recordes mundiais, conquistou títulos mundiais, conduziu a Tocha Olímpica, brilhou como atleta e técnico, e revelou inúmeros talentos. Um dos maiores nomes da história do esporte de Araraquara, o nadador Antonio Carlos Orselli, de 78 anos de idade, concedeu uma entrevista ao Portal Morada e falou sobre sua trajetória, emoções e realizações.

No momento, o nadador sente a falta da piscina, já que utiliza o período de isolamento social por conta da pandemia do novo coronavírus para se recuperar de um procedimento de troca da válvula mitral. Assim, passa o tempo ao lado da esposa, a professora Neusa Orselli, que também possui uma forte ligação com a natação, já competiu em alto nível e foi orientadora das escolinhas por onde ele passou. Confira a seguir a história do campeão.

Nasce um vencedor

Filho de José Orselli e Laura Schiavinatto, Antonio Carlos Orselli nasceu no dia 23 de setembro de 1942 em Araraquara. "Tenho um prazer muito grande de ser cidadão araraquarense, gosto muito da cidade. Aqui comecei minha carreira esportiva e profissional. Estou muito feliz aqui", garante o nadador.

Segundo ele, a paixão pelo esporte surgiu logo cedo em sua vida. "Isso é coisa antiga. Eu me propus a jogar futebol no Parque Infantil, mas eu era muito ruim. Quando a Ferroviária inaugurou a piscina no final de 1953, início de 54, eu passei a frequentá-la, pois meu pai era Ferroviário e um dos sócios fundadores do clube. Na época, o professor Cid Moura Ferrão tinha uma escolinha de natação e eu fiz o aprendizado com ele. Mais à frente, no final dos anos 50, eu passei a competir, já treinado pelo Tito Peixoto, treinador que era um dos primórdios da natação araraquarense", explica Orselli, que sorri ao lembrar de sua primeira disputa. "Na minha primeira competição, em Monte Alto, eu cheguei 'apenas' 25 metros atrás do penúltimo colocado. Então eu fiquei muito bravo, envergonhado e decidi treinar para não ser tão último assim", brinca.

A partir daí, o nadador deu início a uma carreira vitoriosa e marcante em várias cidades do estado. Nadou na Morada do Sol até 1965. No ano seguinte, passou no concurso do Banespa e se mudou para São Paulo, onde adotou o Corinthians como sua nova casa. Posteriormente se mudou para Limeira e Campinas, onde foi treinador do Tênis Clube.

Com sua transferência para o Banespa de Ribeirão Preto, Orselli montou uma equipe de natação no Clube do Palestra. Em 1973 voltou a morar em Limeira e em 1974 retornou a Araraquara, onde assumiu a equipe da Ferroviária, que estava sem treinador, dando início a uma época de ouro na natação araraquarense e transformando a modalidade no carro-chefe do esporte durante o final dos anos 70, 80 e início dos 90. 

Natação de Araraquara era destaque

Quando voltou à cidade em 1974, os Jogos Regionais daquele ano já haviam sido realizados. A equipe montada por Orselli treinava a noite em função do grande número de frequentadores da AFE na época. "O José Wellington Pinto, presidente da Ferroviária na ocasião, nos acolheu muito bem. Ele nos disponibilizou a piscina das 20 às 22 horas e nós aproveitamos muito bem esse tempo, tanto é que Araraquara foi campeã dos Jogos Regionais no masculino e no feminino de 1975 até 1988. Nessa época, a equipe sempre figurou no quadro de honra dos Jogos Abertos do Interior, sempre entre os seis primeiros colocados", destaca.

O ano de 1983 foi de consagração para a Morada do Sol, que se sagrou campeã na natação dos Jogos Abertos, tanto no masculino como no feminino. Nos dois anos seguintes, a cidade terminou na segunda colocação. Em 1986, Araraquara bateu o recorde de medalhas. "Conquistamos 22 medalhas só na natação. Naquela época, a natação carregava o esporte amador de Araraquara, sempre com destaque e honrando as cores da cidade", relembra o nadador.

Dificuldades

Para o campeão, a maior dificuldade enfrentada em sua carreira esportiva foi a falta de interesse dos clubes na época. "Nós sempre treinamos em clubes e sempre tivemos dificuldades para realizar treinos de segunda-feira e às vezes de domingo. Os clubes são associativos, ou seja, mais recreativos que esportivos, e isso está em seus estatutos. A Ferroviária se diferenciava, pois era um clube voltado para o esporte, embora fosse muito restrito ao futebol, que era prioridade das diretorias que passavam por lá, com exceção do presidente Eugênio Ferreira da Gama, que deu um respaldo muito grande para a natação. Na ocasião, criamos o Clube Amigos da Natação, que levantava recursos para a modalidade. A escolinha de natação fazia um movimento financeiro voltado para as competições, pois era difícil obter recursos da Fundesport. Tudo tínhamos que pedir, nada era oferecido. Parecia que o esporte era feito por uma deferência do poder público ou dos clubes. Tenho recortes de jornais para comprovar as dificuldades que sempre foi para levantar recursos. A gente não tinha respaldo", explica.

Outro problema enfrentado era em relação ao inverno, que diminuía muito o tempo dos treinamentos. "Nós fomos ter uma piscina aquecida em Araraquara somente em 1985 e nossos adversários já treinavam muito antes durante o ano inteiro em piscinas aquecidas. Nós tínhamos que reduzir os treinamentos pela metade e quando íamos competir no Troféu Bandeirantes, em maio, ganhávamos dos nossos adversários sempre com alguma facilidade. Isso graças a qualidade dos atletas que a gente tinha. Tivemos uma safra de excelentes nadadores nos anos 70 e 80, com uma moçada disciplinada, interessada, um amigo do outro, o que gerava um espírito de camaradagem muito grande. Os treinos refletiam isso, pois um queria ganhar do outro no treino e na hora da competição quem ganhava era a equipe", relembra orgulhoso.

"Era uma motivação e uma alegria muito grande. Chegávamos no vestiário e era uma gritaria, todo mundo muito animado. O número de nadadores sempre foi grande. Nós viemos aqui para o Clube Araraquarense em 1985 e a equipe tinha mais de 120 nadadores", salienta o nadador, que há alguns anos doou à Uniara um acervo de 32 volumes encadernados com matérias jornalísticas da época.

Maiores alegrias

Apesar de tantas medalhas conquistadas, Antonio Carlos Orselli elege como a maior alegria de sua vida o fato de ter dois filhos nadadores: Antonio Carlos Orselli Junior e Adriana Cristina Orselli. O filho foi campeão mundial máster nos 200 metros peito na Nova Zelândia em 2002, além de conquistar o título de campeão brasileiro universitário durante os dois cursos superiores que fez. "Ele também foi campeão e recordista paulista e um excelente técnico de natação. Hoje é auditor fiscal em Santa Catarina", conta Orselli. "A Adriana foi grande campeã, recordista por quatro anos seguidos nos 100 metros borboleta dos Jogos Abertos. Foi campeã brasileira universitária e campeã brasileira colegial", completa.

"O grande prazer foi ter compartilhado da companhia dos meus filhos na beira da piscina durante muitos anos, além da satisfação de ter mantido meus atletas como meus amigos. Os pais de atletas são meus amigos até hoje. A cidade também tem reconhecido esse esforço. Um exemplo é a piscina do Pinheirinho, que leva o nome do meu pai e isso eu acho que foi um reconhecimento pelo meu trabalho, porque meu pai nunca foi nadador. Também recebi o Diploma de Honra ao Mérito da Câmara Municipal, o que me deixa muito feliz", diz o araraquarense, que também foi homenageado em 2016, quando foi um dos condutores da Tocha Olímpica, que passou por Araraquara antes dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

Títulos inesquecíveis

Orselli afirma que cada medalha uma tem a sua história, mas a mais prazerosa foi vencida em 1996, na cidade de Sheffield, Inglaterra, onde conquistou dois títulos mundiais. "Nós montamos uma equipe de revezamento com o objetivo de vencer os 4×50 metros quatro estilos. Patrocinados pela Viação Paraty, fomos para a Inglaterra e tínhamos certeza de que traríamos uma medalha. De fato, no segundo dia disputamos e ganhamos o ouro com alguma facilidade. Dois dias depois, nadamos o 4×50 livre, que não tínhamos nenhuma expectativa. Ganhamos por 17 centésimos de segundo e foi meu segundo título de campeão mundial. Quando vimos no painel o tempo da prova, foi uma festa muito grande, uma alegria que a gente não esquece", ressalta.

Natação e família

Para Orselli, a natação é muito mais que um hobby. "Significa uma parte bem substancial da minha vida. Já fui atleta, técnico, dirigente e atleta máster. Minha mulher sempre viajou comigo e também competia em alto nível. A Neusa sempre foi a orientadora das escolinhas por onde passei e também revelou muitos nadadores. Então se eu não fosse um treinador de natação, eu seria um bancário que teria passado pela vida em brancas nuvens, sem fazer nada em favor dos outros. O fato de ter trabalhado com vários atletas de alto nível é algo que me deixa muito feliz. A natação é 40% de minha vida", completa.

Cenário atual

Com o atual cenário da pandemia, Orselli acredita que o calendário da natação mundial passará por mudanças. Ele avalia positivamente o trabalho realizado pelos atletas brasileiros. "A natação brasileira vinha se preparando, e bem, para as Olimpíadas. E, com o ocorre no planeta, haverá a necessidade de todos reestruturarem o plano quadrienal elaborado para a principal competição do período. Para os que encerrariam a carreira em Tóquio, neste ano, ficará mais difícil manter a forma até ano que vem", avalia.

Ele também aproveita para analisar o desenvolvimento da modalidade na cidade. "Em Araraquara está se fazendo um trabalho novo com crianças e, principalmente, adultos e seniores na Ferroviária e no Araraquarense. A falta desse trabalho de renovação era um empecilho ao desenvolvimento da modalidade", analisa o campeão. 

O atleta, que vinha comandando o projeto realizado no Clube Araraquarense, lamenta a atual fase de inatividade e espera se recuperar para se reencontrar com as águas. "Minha vida, como a de todos, é um marasmo. Impossibilitado de ir à academia e treinar na água, logo depois de uma cirurgia cardíaca braba, sinto-me totalmente inapto a voltar ao antigo estado. Subo escadas e faço exercícios abdominais e com borracha, mas nunca é a mesma coisa de estar orientado pelo preparador físico e participar dos treinos com a galera", conta. 

Para Orselli, a natação é um motivo de inspiração. "A natação faz parte da minha vida desde a juventude. Isso tem mais de 60 anos. Dediquei a ela menor atenção apenas daquela que dediquei à família. E, por isso, sinto tanta falta. Espero viver ainda o suficiente para voltar a sentir-me completo, podendo voltar a treinar", conclui o nadador.

E se ele sente a falta das piscinas, com certeza elas também só se sentirão completas novamente quando voltarem a abraçar esse nadador que é um exemplo de dedicação como atleta, profissional, mestre e pai de família. O esporte e a cidade de Araraquara agradecem por sua história. 

 

PRINCIPAIS TÍTULOS DE ORSELLI

CAMPEÃO MUNDIAL SETE VEZES

1- Revezamento 4×50 metros medley em Sheffield (eng) em 21.06.1996, tempo de   1.57.70, com Vadimir Michailowsky Leite Ribeiro, Ricardo Alves dos Santos e Luiz Antonio Lopes Fagundes. 
2- Revezamento 4 x 50 metros livre, na mesma competição, com os mesmos companheiros, com o tempo de 1.45.36.
3- 100 metros nado peito,  em Riccione, no dia 11 de junho de 2012 com 1.25.25, novo recorde sul-americano e segunda melhor marca all-time da FINA.  
4- 50 metros nado peito, com 38.14, em Riccione, em 13.06.2012 – Novo recorde sul americano 
5- 100 metros borboleta, com 1.24.99, na mesma competição e no mesmo dia, também nova marca para o continente.
6- 50 metros nado peito, em Budapeste, no dia 20.08.17, com 39.22
7- 4 x 50 metros medley, em Budapeste, no dia 18.08.17. cp, 2.16.15

OITO RECORDES MUNDIAIS

Piscina – Prova – Data – Tempo – Companheiros
50m – 4 X 100 L – 05.11.2010 – 4.33.41 – Vladimir Ribeiro, Paulo Motta e Marcelo Piva 
25m – 4 X 200 L – 18.09.2011 – 11.19.67 – Gyorgy Pavetits, José E. Guisard e Ondamar Silva
50m – 4 X 200 L – 19.04.2012 – 11.28.36 – Gyorgy Pavetits, José E. Guisard e Ondamar Silva
50m – 4 X 100 L – 21.04.2012 – 4.45.40 – Gyorgy Pavetits, José E. Guisard e Ondamar Silva
25m – 4 X 50 M – 15.03.2015 – 2.12.76 – José O. Loro, Paulo Motta e Gyorgy Pavetits 
25m – 4 X 100 M – 04.06.2016 – 5.05.89 – José O. Loro, Paulo Motta e José E. Guisard
50m – 4X50 M – 18.08.2017 – 2.16.15 – José O. Loro, Paulo Motta e José E. Guisard
50m – 50 PEITO – 20.08.17 – 39.22 – Primeiro recorde mundial individual

66 RECORDES SUL-AMERICANOS

Orselli foi 66 vezes recordista sul-americano: a 1ª em 2 de janeiro de 93, em Belo Horizonte, categoria 50/54 anos, 200m Peito em 3.06.13. A última foi em 8 de junho 2019, no revezamento 4×50 medley, categoria 280/319 anos, em 2.39.68.

109 VEZES NO TOP-10 DO RANKING MUNDIAL DA FINA

O araraquarense figurou 109 vezes no Top Ten no Ranking Mundial da FINA – a 1ª nos 50m Peito em 1988, no Mundial de Sheffield – categoria 45/49 anos, com 35.89, 9º lugar. A última em 2019 no 4×50 livre 320/359 anos, em 2.44.79 – 5º lugar. Ficou com a melhor marca do ano por 14 vezes. Oito vezes recordista mundial, a 1ª vez em 5 de novembro de 2010 no 4×100 livre 200+ em 5.11.20. A última em 20 de agosto de 2017 nos 50 peito, em Budapest, com 39.22.  Sete vezes campeão mundial, duas em revezamentos em Sheffield/ 1996, três em Riccione/2012, nos 50 e 100 peito e 100  borboleta, duas em Budapest nos 50 peito e 4×50 medley.

 

CONDUZIU A TOCHA OLÍMPICA

Em julho de 2016, Orselli conduziu a Tocha Olímpica, que passou por Araraquara em um evento comemoratico às Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. O Bradesco, um dos patrocinadores dos Jogos, produziu uma entrevista sobre a indicação do nadador. Clique aqui para assistir.
 

 

 

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