Ninguém é forte sempre e há momentos na vida em que nos encontramos um pouco distantes de nós, de quem somos verdadeiramente e de quem merecemos ser. Em momentos assim, em que nos encontramos solitários de nós, podemos cair em uma grande armadilha da carência emocional: os exploradores emocionais.
Todo mundo pode assumir esse posto e todo mundo pode vir a sofrer como vítima. Ser ou viver com um explorador emocional não é maldição ou privilégio de poucos, é a possibilidade de muitos, considerando o momento em que o sentimento se acinzenta e a vida para.
Quando assisti ao filme Harry Potter e lá vi os dementadores, fiz uma ponte com essa delicada questão. Os dementadores não só assombravam como também sugavam a energia vital de suas vítimas e, portanto, eram perigosíssimos. As vítimas, se alertas, se escondiam, mas se indefesas, eram pegas e aniquiladas.
Assim como na ficção, os dementadores existem. Eles são os exploradores emocionais, pessoas que por não terem consciência de si acabam por aniquilar a vida emocional do outro. Um explorador emocional pode ser um amigo, um parente, o esposo, a prima, a filha, enfim… Qualquer pessoa que, uma vez não atenta a si, não consegue enxergar o mundo do outro e acaba criando uma convivência pesada e solitária e deixando na vida do outro um profundo vazio existencial.
Não é preciso citar exemplos, sempre existirá em nossa memória alguém que prometendo nos trazer o bem, nos proporcionou um turbilhão de ansiedades, desculpas e nos fez carregar uma carga além do que poderíamos e mereceríamos carregar. Às vezes o culpado não é apenas o outro e sim também a gente mesmo, que não enxerga além do que poderíamos ou conseguiríamos enxergar.
São em momentos assim que a terapia se faz tão necessária. Se lidamos bem com a gente mesmo e se conhecemos quem somos e merecemos ser, não permitimos e não assumimos o papel de vítima, nem tão pouco de exploradores emocionais.
Não permitimos que o outro se acovarde e se aconchegue em nós como uma muleta, uma segunda opção, como alguém que merece pouco ou tão pouco alguém que mereça a sombra do outro. Aquela parte sombria da psique que existe dentro de cada um de nós e que, se não conhecida e não trabalhada, acaba por assombrar os que estão próximos.
Os exploradores emocionais não são apenas os vilões, eles perdem e muito. Perdem a possibilidade de relações sadias com pessoas que lhes são caras, perdem a oportunidade de vínculos saudáveis e acabam muitas vezes solitários interiormente assim como suas vítimas, pois de nada adianta estar ao lado superficialmente, estar ao lado verdadeiramente é estar dentro, de modo a comungar com o outro, de modo a caminhar junto, numa conexão interna e mútua.
Hoje percebo muitos filhos assumindo a posição de exploradores emocionais, pessoas que já adultas acabam por fixar nos pais a sombra de seus fracassos e suas carências, fazendo com que a relação pai e filho se desgaste e se torne solitária. São os filhos que abusam dos pais, seja emocional ou financeiramente, que se negam a enxergar seu crescimento, que sugam uma relação que tem como símbolo a beleza do início.
São os netos que se negam a viver a experiência dos avós, são os companheiros abusivos, intrusivos, que não respeitam o outro em sua particularidade, que assumem uma perigosa personalidade possessiva e egoísta e que acabam por ferir, seja emocional ou fisicamente, quem está ao seu lado.
Quando damos ou recebemos um tapa é mais fácil sentir o impacto, porque visualizamos o ato, enxergamos o fato, enquanto quando esse tapa é emocional, muitas vezes acabamos por não enxergar sua dimensão dentro de nós. Enganamos a nós mesmos ou nos introvertemos, nos culpamos ou até mesmo não nos resolvemos por não saber como lidar com situações como essa. Deixamos para trás e esquecemos que o inconsciente não esquece. Ele irá nos cobrar esse tapa, seja hoje, amanhã ou num futuro distante.
É preciso que estejamos atentos ao papel que estamos fazendo na vida do outro e é preciso que procuremos ajuda caso venhamos a nos sentir os vitimados ou os exploradores.
Essa não é uma questão fechada, todos erramos e nem sempre temos consciência de nossos erros, mas o erro não significa o fim, o erro é um tropeço para que possamos acalmar os passos e mudar o rumo.
É sempre possível enxergar além. Ninguém merece viver de migalhas, o pão que nutre é mais saboroso se repartido de modo feliz.